Comunicado Nelson Wilians e Advogados Associados
Sobre a recente decisão do STF sobre a rubrica de "1/3 de férias" - julgado no RE Nº 1.072.485
Consolidando reiterada e uniforme jurisprudência, a Colenda 1ª Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, STJ, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo REsp nº 1.230-957-RS, de relatoria do Excelentíssimo Senhor Ministro Mauro Campbell Marques, firmou o entendimento de que “a importância paga a título de terço constitucional de férias possui natureza indenizatória/compensatória, e não constitui ganho habitual do empregado, razão pela qual sobre ela não é possível a incidência de contribuição previdenciária (a cargo da empresa)” (Tese 479) (j. 26/02/2014, DJe 18/03/2014).
Todavia, o Supremo Tribunal Federal, STF, por meio de seu Plenário Virtual – obstando-se, cumpre registrar-se, o amplo debate que a relevante matéria reclama -, concluiu na última sexta-feira, 28/08/2020, o julgamento do Recurso Extraordinário com Repercussão Geral RE nº 1.072.485-PR, sagrando-se vencedora a tese proposta pelo Relator, o Eminente Ministro Marco Aurélio, “é legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”.
A decisão supra causou imensa surpresa aos contribuintes e à comunidade jurídica em geral, seja por sua posição diametralmente oposta à firmada pelo Tribunal da Cidadania há mais de seis anos; seja por representar superação de entendimento (overruling) da própria Corte Suprema que, invariavelmente, se posicionava pelo caráter infraconstitucional do tema ou até mesmo pela não incidência da contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de 1/3 de férias, consoante histórico jurisprudencial consignado no voto vencido do nobre Ministro Edson Fachin.
A novel decisão, data vênia, representa, s.m.j., grave ofensa ao princípio da proteção da confiança, visto que a referida tese do STJ já havia sido replicada em milhares de decisões judiciais ao longo dos anos, pautando o escorreito planejamento das empresas em atividade no nosso país, restando desrespeitado, assim, o dever dos Tribunais de manterem sua jurisprudência uniforme, estável, íntegra e coerente (art. 926 do Código de Processo Civil – CPC).
Nesse contexto, aguarda-se a proclamação do resultado do julgamento e a publicação do respectivo Acórdão para que se possa corretamente compreender qual é a sua real extensão, bem como espera-se que o STF aplique a técnica de superação prospectiva de precedente (prospective overruling), com a imprescindível modulação dos efeitos da decisão, sendo inegável, no caso concreto, a presença do interesse social e o reclamo da segurança jurídica (art. 927, §3º, do CPC).
Crucial destacar, nesse ponto, a existência de precedentes da própria Corte Suprema no sentido de ser imprescindível o respeito à consolidada e pacífica jurisprudência até então reinante (vide, v.g., o RE 594.435-ED, DJe 23/09/2019: “2. Tendo em vista a duradoura jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho em sentido oposto ao decidido pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL neste precedente, surge, inevitavelmente, o interesse em resguardar os atos praticados ao longo de vários anos, enquanto perdurou a indefinição acerca do Juízo competente para dirimir a controvérsia.” – grifou-se), lembrando-se; outrossim, que para a modulação dos efeitos de decisão em julgamento de RE com Repercussão Geral no qual não tenha havido declaração de inconstitucionalidade (como no caso concreto), basta o quórum de maioria absoluta dos membros do Tribunal (06 Ministros), não se exigindo o quórum qualificado de 2/3 (8 julgadores) (conforme RE 638.115 ED-ED, j. 18/12/2019, DJe 08/05/2020).
De qualquer forma, com ou sem a superação prospectiva, a questão será oportunamente remetida à 1ª Seção do STJ para reexame nos próprios autos do REsp nº 1.230.957-RS (art. 1.040, inc. II, do CPC), sendo possível, mediante procedimento de “Revisão de Entendimento Firmado em Tema Repetitivo” (arts. 256-S e seguintes do Regimento Interno daquele Tribunal), em análise de conformação com o novel paradigma do STF, o eventual juízo de retratação ou até mesmo a distinção (distinguish), com a manutenção do entendimento consolidado na Tese 479 (o que implicaria remessa do Recurso Extraordinário sobrestado naquele feito para o Supremo, nos moldes do art. 1.041, caput, do CPC).
Em qualquer hipótese, não se deve olvidar que a eventual modificação de tese anteriormente adotada em julgamento de casos repetitivos (in casu, proferida e consolidada há mais de seis anos, repita-se), demanda fundamentação adequada e específica, com a inafastável atenção aos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia (art. 927, §4º, do CPC).